Estranhos que visitaram

domingo, 24 de outubro de 2010

A rotina dos que amam demais





“Eu bato o portão sem fazer alarde, eu levo a carteira de identidade, uma saideira, muita saudade e a leve impressão de que já vou tarde” Chico Buarque de Hollanda



A rotina dos que amam demais

Tô passando pra dizer que desisti. Não, por favor, não me diga pra tentar. Aqui, só eu fui capaz de amar, e agora, só eu sou capaz de dizer “adeus”. Não torne tudo mais difícil, porque esse foi um amor que você nunca soube que tive, eu nunca tive coragem de dizer, e esse momento em que a gente se afasta pra você não me causar esperanças, para mim, é idiota.

Eu te amo e independente do que você faça, com ou sem você esse sentimento estará dentro de mim, você acha que há lugar mais perto para esse amor ficar? Ah, por favor, não seja ridículo em dizer que eu sou muito boa pra você e que eu vou encontrar alguém melhor, não diga nada. Você falando fere mais, nem me olhe assim com esse ar de quem tem pena por não chegar ao mesmo nível de sentimento, quando eu embarquei nessa viagem suicida eu sabia de tudo.
Cada atitude sua, a partir de agora, vai ser calculada, você não vai ser o mesmo comigo, você vai pensar sempre naquela conversa em que eu te disse uma das coisas que mais te fizeram mal. Eu te disse do amor que eu sinto por você, te machucou, não é?
Fiz tudo errado, tudo poderia ser como sempre foi, eu te amando, você fingindo não ver, eu te querendo, você brincando comigo e eu fingindo não ver. Eu me odeio agora, te odeio um pouco também. Eu odeio o mundo por não ter conspirado e ter feito você me amar, me ligar, por mim, sonhar.
Eu preciso muito ir embora e perceber que eu perdi o jogo, eu tenho vergonha de olhar pra você, evite-me. Eu vou ser forte, não vou te ligar, não enviarei e-mail, nem vou perguntar como você está quando encontrar sua tia na farmácia. Ah, ela sabia de tudo e torcia muito por nós dois. Não me venha com essa de que foi o último a saber que eu deveria ter contado desde o início, quando você amar de verdade, vai lembrar dessa situação e vai desejar por um minuto perguntar a mim como reagir, mas aí vai ter o bom senso de que vai me magoar, e que deve medir todo tipo de conversa comigo, porque tudo aquilo que a gente tinha se quebrou quando eu te disse “eu te amo”, frase feia.

Sim, eu estou me preparando pra fase onde as pessoas vão me ter como exemplo e vão querer tomar atitude, só que vão lembrar que eu fracassei e vão ter mais pudor pra falar de amor a quem se ama. Só que eu queria saber o motivo de você não ficar comigo. Tá eu já sei que a gente não escolhe etc, etc, etc. Mas eu sou a pessoa que mais te ama ou já te amou na vida, eu passo o dia pensando em você, querendo de ter, pensando em te fazer bem e matar a quem de ti fala mal. Aí você dispensa meu amor, como quem rejeita um copo de suco na casa de um estranho. Eu fiz o que você é, e quando eu for embora você vai sentir falta. Não, eu não vou dar a volta por cima, nem vou querer um carinha pra te derrubar, eu só vou lembrar que eu te amo muito, ainda. E que você fez história em mim, que outros amores virão, mas que você foi o meu amor.
Desculpa por ter confundido as coisas, desculpa por ter estragado tudo com esse amor. Mas como seu coração não me escolheu, o meu foi mais rápido e fez a dele. A pressa foi a inimiga do meu amor. Usa esse tempo como uma borracha, eu queria poder pedir pra você não se achar em alguém, nem amar alguém, porque pros apaixonados não correspondidos, o outro vai acordar e cair em si, mas eu sei que você não está sonhando, nem dormindo, por isso eu digo: seja feliz. Eu vou fechar os olhos e vou seguir, não sei a direção, não sei nada, mas to indo. Tô indo sentir outro gosto, outro cheiro. Pare de fumar, pague as contas, lave sua roupa... Quer dizer, não sei mais o que dizer, esquece o que eu disse. Não esqueça, eu não me arrependo desse sentimento. Você não me ama, mas eu te amo e isso acabou com quem somos nesse momento. Desculpa. Adeus.

domingo, 10 de outubro de 2010

Femme



Eu entrei e comecei a ouvir gritos. O calor foi instantâneo. Abri um sorriso e sabia que ia gostar de tudo que poderia me acontecer, eu queria tudo. As luzes vermelhas me faziam mais bonita e tudo cheirava a pecado, desejo, língua. Era uma dança para o sexo. Batom, perfume, cabelo, pele. Tua boca me tomou e eu queria mais. Teu cheiro e tua mão me diziam o quão canalha tu eras.

As pessoas estavam lá, era um tipo de adoração ao prazer, ao momento em que os olhos se fecham, os arranhões surgem nas costas do outro e expiramos sem cessar. Era sujo, era bom. Mas eu não tinha pudor, você era silencioso, me levava à loucura, perdi minha cabeça. Corredores percorridos, bebidas entornadas, as luzes vermelhas dançavam, eu sorria.

não pensava em nada, eu queria diversão, eu queria mais de tudo. Encontrei outro que pudesse me fazer sentir medo, a minha liberdade sempre ofendeu os outros, eu queria provar mais de tudo e chocar mais, era um jogo, eu nunca perdia. Meu namorado, coitado, achava que eu estava na casa de uma tia no interior, meu lema era amor, sem contratos, sem amarras e um pouco de omissão.

Sussurros, meu amor escorria pela pele. Vários sentiram durante a noite, em litros, eu me derreter na emoção de ser do mundo, eu era mais eu, mais impura, mais feliz, eu não tinha barreiras, eu me amava e deixava que me amassem mais e mais. Entre pernas, calor e ausência de roupas eu me sentia completa. Eu sempre tinha uma ideia nova. Não tinha limites na noite, o ‘’p.m’’ me trazia a delícia de sentir o que os outros queriam, mas o receio não os permitia. Eu me libertava, eu sentia, eu gemia. Escolhi Rodrigo para brincar. O momento da escolha me fazia uma criança que escolhe o brinquedo na vitrine, tomei-o pela mão, era minha curtição daquela sexta.

Quatro paredes, uma cama que podia quebrar a qualquer instante e um homem para mim. Era uma briga coreografada, palavras chulas, risos altos, puxões de cabelo e corpos escorregadios. Sabia muito bem que horas depois eu estaria com nojo dele, que queria o meu bem, que estaria sozinha. O cheiro do cigarro no quarto me entediava. Eu só não sabia que minha noite não iria ser tão cansativa como eu previa. Dei a Rodrigo a dica ‘’nunca diga que isso nunca aconteceu’’, honestamente, tentar me convencer que era o ‘’fodão’’ me dava mais vontade de matá-lo. Irritava-me mais ainda. Olhei minha bolsa, abri-a procurei meu batom e meu blush, retoquei a maquiagem. Sempre guardo um vidro de perfume na bolsa, dessa vez o esqueci. Sacudi meu cabelo, bati a porta e sem nada dizer, ganhei novamente o que sempre julguei ser meu: o mundo.